Aniello
dos Reis Parziale - OAB/SP nº 259.960. Advogado, Bacharel pela
Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, membro
do Consultoria Jurídica da Editora NDJ desde 2007. É mestrando em
Direito Econômico e Político pelo Programa de Pós-graduação da
Universidade Presbiteriana Mackenzie.
SP,
19/1/2015
Encerrou-se
em 31 de dezembro de 2014 o prazo previsto no art. 218, §§ 3º e
4º, inc. VI, da Resolução nº 414/2010, concedido pela Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para que todas as
concessionárias de energia elétrica concluam, sem ônus, a
transferência aos Municípios do sistema de iluminação pública
de forma a permitir que a prestação dos serviços de iluminação
pública sejam realizados, doravante, pela Comuna.
De
acordo com a disciplina assentada no referido dispositivo
regulamentar, os Municípios receberão o parque de iluminação
pública, fato que implicará que a gestão, manutenção e
administração dos serviços de iluminação pública sejam
realizadas pelo ente municipal, sem interferência da concessionária
local, cuja função será apenas e tão somente fornecer a energia
elétrica necessária para o funcionamento dos equipamentos
trespassados. Em relação ao patrimônio a ser transferido ao
Município, verificam-se o relé fotoelétrico (necessário para
propiciar o acendimento automático da lâmpada); braço; reator;
cúpula ou luminária; soquete e lâmpada. Grife-se que o poste não
é objeto de transferência, salvo se ele for específico para
iluminação (poste ornado, por exemplo).
Acerca
das novas funções a serem desempenhadas pela Ad-ministração
Pública Municipal, destaca o advogado Alfredo Gioielli: “gestão,
manutenção de todo sistema de distribuição, atendimento, operação
e reposição de lâmpadas, suportes, chaves, troca de luminárias,
reatores, relés, cabos condutores, braços e materiais de fixação
e conexões elétricas” (Municipalização
de iluminação pública pela Aneel é ilegal.
Disponível em:
<http://http://www.conjur.com.br/2013-mar-21/alfredo-gioielli-municipalizacao-iluminacao-publica-aneel-ilegal>.
Acesso em: 22 out. 2014).
Sem
adentrar na polêmica relacionada à forma como ocorreu a
transferência do parque de iluminação pública à Comuna,
verifica-se que a determinação da Aneel repousa no fato de que os
Municípios, conforme estabelece o art. 30, inc. V, da CF/1988, detêm
a atribuição de organizar e prestar serviços públicos de
interesse local, inserindo-se aí a iluminação pública.
Em
relação às benesses vislumbradas com tal transferência,
destaca-se que a municipalização dos serviços de iluminação
pública poderá gerar a prestação de serviços mais eficientes e
planejados, haja vista o maior controle da Administração na
operação. Nesse sentido, grife-se que tal rapidez na prestação de
manutenção corretiva
e
preventiva
do
parque de iluminação pública garantirá segurança à população,
vez que os locais pouco ou sem iluminação são os mais propensos
para cometimento de crimes de toda sorte. Demais disso, com a
prestação de serviços públicos realizada pelo Município, poderão
ser implementadas medidas que garantam a redução de consumo da
energia, gerando economia ao Erário, a exemplo da substituição das
lâmpadas incandescentes, que consomem mais energia elétrica, por
lâmpadas do tipo LED ou fluorescente, cujo consumo é reduzido.
Outrossim, poderá, ainda, ser substituída a matriz energética,
dada a possibilidade do uso de energia solar e eólica, em detrimento
da elétrica, para a iluminação.
Preliminarmente
à transferência do parque de iluminação pública pela
concessionária de energia, deverá a Administração Pública
planejar-se em relação a tal recebimento, realizando, dentre outras
providências, o levanta-mento dos equipamentos já instalados e em
operação, apontando-se as suas condições físicas; o planejamento
futuro de atuação na manutenção preventiva e corretiva; a eleição
da forma como serão prestados tais serviços: (1) se diretamente,
ou seja, pelo próprio Poder Público, fato que demandará a
necessidade de aparelhamento da Administração; criação de órgão
para gerir a execução dos serviços, receber as ligações etc.;
realização de concurso público para contratação dos
profissionais; aquisição de equipamentos e insumos por meio de
licitação; ou (2) indiretamente,
por empresa contratada mediante licitação, adoção de Parceria
Público-Privada ou, ainda, por meio da participação de um
consórcio intermunicipal, cuja constituição é disciplinada pela
Lei Federal nº 11.107/2005.
Nas
tratativas a serem realizadas entre o Poder Público e a
concessionária, nessa oportunidade, devem os entes municipais
questionar o estado em que se encontram os bens a serem futuramente
trespassados, não devendo aceitá-los se eles estiverem sucateados
ou sem que estejam recebendo a correta manutenção ou produzidos em
desconformidade com as regras da ABNT. Grife-se que receber os bens
nessas condições demandará a substituição deles futuramente,
fato que gerará prejuízo para os cofres públicos. O que se tem
recomendado é que “O município deve condicionar a transferência
de ativos a que a concessionária de distribuição promova as
adequações necessárias no parque de iluminação pública,
deixando-as em condições normais de funcionamento” (GIOIELLI,
Alfredo; KIRCHNER, Carlos Augusto Ramos. Informações
necessárias para a realização do plano de transição de domínio
da gestão da iluminação pública.
Em:
<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_cidadania/iluminacao_publica/Manual
de Boas Práticas na Transferência de Ativos de IP.pdf>. Acesso
em: 22 out. 2014).
Em
relação à celebração do termo de transferência do parque de
iluminação pública, tendo em vista que o competente ajuste não
detém cláusulas-padrão, deve a Administração questionar os
termos propostos pela concessionária de energia elétrica, devendo
ser rechaçadas cláusulas que o Poder Público entender serem
abusivas, uma vez ser necessário garantir um ajuste equânime entre
a partes, bem como afastar qualquer tipo de prejuízo para o
interesse público.
Atuando
de forma planejada, sempre com apoio da concessionária de energia
elétrica, que deverá prestar, quando necessário, as informações
pertinentes nesta fase de transição, evita-se a judicialização da
transferência do parque de iluminação pública, de modo a afastar
qualquer tipo de prejuízo à prestação desse serviço público.
No
que tange às obrigações da concessionária de energia elétrica,
vislumbra-se, dentre outras, a necessidade de encaminhamento de
relatório analítico dos bens a serem transferidos, apontando-se,
ainda, a situação física destes, bem como qualquer outro dado
solicitado pela Administração, ex
vi do
teor contido no art. 218, § 7º, da resolução em destaque; a
exigência de transferência de equipamentos que observem as normas
técnicas existentes; o apoio no início da prestação de serviços
pela Administração ou terceiro contratado; a assistência técnica
futura, haja vista a dependência na energia elétrica da
concessionária etc.
Em
relação à Administração Pública, deverá ser elaborado pelo
setor competente um estudo de impacto orçamentário dos serviços a
serem realizados por pessoal próprio (execução direta) ou
terceirizado (execução indireta). No que tange à atuação do
setor jurídico, este deverá, dentre outros aspectos, analisar os
termos da transferência do parque de iluminação pública, com o
consequente afastamento de cláusulas abusivas impostas pela
concessionária, assim como elaborar o termo de responsabilidade
civil e criminal das informações prestadas pela concessionária. Já
o setor de engenharia deverá elaborar laudo que descreverá o
estado dos equipamentos, que será cotejado futuramente com o
relatório elaborado pela concessionária. O exame deste relatório
deve ser rigoroso, de forma a revestir a Administração da segurança
necessária quanto à sua verossimilhança, isto é, sua fidelidade
em relação à realidade dos equipamentos. Demais disso, deverá ser
elaborado pelo setor de engenharia um plano de execução dos
serviços, termo de referência ou projeto básico, em caso de
execução indireta, haja vista que tais documentos deverão constar
do edital de licitação posteriormente. Por fim, deverá o setor de
meio ambiente elaborar um plano de descarte das lâmpadas.
Grife-se
que o recebimento do parque de iluminação pública deverá ser
realizado formalmente, mediante vistoria em todos os equipamentos,
devendo as impropriedades serem consignadas no documento, a fim de
serem objeto de reparação, em prazo a ser fixado pelo Poder
Público, bem como afastar futura responsabilização da
Administração.
Diante
da complexidade envolvida e volume de trabalho, veri-fica-se que
algumas Municipalidades processaram competente licitação com o
escopo de contratar um particular para realizar tais providências
preliminares, a fim de observar o prazo imposto pela Aneel. Ante todo
o exposto, portanto, para aqueles Municípios que ainda não se
organizaram para receber tal encargo, tomadas tais cautelas, dentre
outras, garante-se o regular trespasse do parque de iluminação
pública, sem que ocorra solução de continuidade dos serviços
públicos e, por conseguinte, prejuízo ao interesse público.
Por
Aniello dos Reis Parziale – Advogado, membro do Corpo Jurídico da
NDJ
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