Orientação Normativa/AGU nº 11, de 01.04.2009 - “A
contratação direta com fundamento no inc. IV do art. 24 da Lei nº
8.666, de 1993, exige que, concomitantemente, seja apurado se a
situação emergencial foi gerada por falta de planejamento, desídia
ou má gestão, hipótese que, quem lhe deu causa será
responsabilizado na forma da lei”. 1
O inc. IV do art. 24 do Estatuto federal Licitatório ampara o
afastamento da licitação para a aquisição de bens ou contratação
de serviços nos casos de emergência ou de calamidade pública2,
quando caracterizada3
urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo
ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços,
equipamentos e outros bens, públicos ou particulares.
Todavia, observam-se casos em que por falta de planejamento, desídia,
4
ou outros motivos alheios ao interesse público5
gera-se uma situação emergencial, necessitando efetivar uma
contratação direta às pressas, já que inexiste tempo para o
processamento de uma regular licitação. Neste caso, arrima-se a
contratação no supramencionado dispositivo a fim de estancar tal
situação.
A exemplo, existindo em determinado Município uma tradição que
convola na realização de determinada festa, a qual ocorre
anualmente sempre na mesma data, instaura-se a licitação a poucos
dias que a antecede, e observa-se, no meio do expediente
administrativo, a ausência de tempo hábil6
para a conclusão do certame. Por conseguinte, visualizando-se
eventual prejuízo com a realização do referido evento, há
deliberação para a contratação emergencial.
Esclareça-se que o caso aventando, é uma típica fabricação da
situação emergencial, que por meio da orientação em relevo
espera-se impedir, na medida em que a necessária apuração da
origem da situação emergencial ou calamitosa, geradora de eventual
responsabilização do servidor que deu causa, mitigara a ocorrência
desta situação ilícita. E é esse o expediente que deseja a AGU,
por meio da orientação estudada, obstar, na medida em que impõe
que se apure a causa da emergência
Com efeito, observando, ainda, o exemplo proposto, o fato de a festa
ser realizada anualmente, reforça a desídia ou inércia observada,
uma vez sabia-se de antemão a data em que deveria estar disponível
a estrutura necessária para a realização do evento. Por ser
oportuno, sobre a emergência ficta, preleciona o saudoso jurista
Diogenes Gasparini,7
in verbis:
“A
emergência, como hipótese de dispensabilidade de licitação
consignada no inc. IV do art. 24 do Estatuto federal Licitatório, é
caracterizada pela necessidade imediata ou urgente do atendimento do
acontecido ou por acontecer, pois, se não for assim, será inútil
qualquer medida posterior. Só o pronto atendimento pode evitar
situações causadoras de prejuízos e salvaguardar a segurança das
pessoas, obras, bens e equipamentos ou reduzir as conseqüências
quando os fatos já aconteceram. (...) Nessas hipóteses diz-se que a
emergência é real, pois seu surgimento não decorreu de qualquer
comportamento, comissivo ou omissivo, da Administração Pública.
Portanto, não é de emergência real a situação que deve ser
resolvida de imediato (compra de distintivos, hoje, para com eles
serem agraciados amanhã os funcionários que completaram 20 anos de
serviço público), quando dela já se tinha conhecimento muito tempo
antes. Nessa hipótese, diz-se que a emergência é ficta, ou
fabricada. Em tais casos, há negligência, não urgência. Apesar
disso, contrata-se, e pela negligência responderá a autoridade
omissa, depois de devidamente apurados todos os fatos”.
No exemplo aventado, a licitação deveria ser instaurada em tempo
capaz de concluir a competição e realizar a devida celebração do
ajuste, permanecendo, assim, a prestação de serviços debaixo do
manto da regularidade.
Como se claramente depreende-se da orientação estudada, a fim de
evitar a impunidade àqueles que tratam da coisa pública em observar
os contornos legais, Administração Pública, deverá,
concomitantemente a toda contratação direta, gerada por uma
emergencial ficta ou real, ser apurado nos autos do competente
processo administrativo, eventual falta de planejamento, desídia, má
gestão, dentre outros, do agente público.
Por conseguinte, caso a incúria ou inércia administrativa se
confirmem, o que configurará infração a dever funcional de
observar as normas legais e regulamentares, deverá o competente
servidor, conforme estabelece o art. 82 do Estatuto federal
Licitatório c/c inc. III do art. 116 do 8.112/90, ser devidamente
responsabilizado, após a conclusão de processo administrativo
disciplinar onde reste garantido o contraditório e ampla defesa.
Acerca dos limites da responsabilização do produtor da emergência
ficta, versa Jessé Torres Pereira Junior,8
in verbis:
“A parte final do parágrafo único impõe à Administração o
dever de apurar a responsabilidade quanto à acusação do vício
fatal. Promover responsabilidades responsabilidade, para usar-se o
verbo da lei, significa atuar em três esferas: responsabilidade
administrativa (de que poderá resultar a aplicação de penalidades
a servidores); responsabilidade pena (mediante remessa de peças ao
Ministério Público, para que este, caso convença-se de que há
indícios do crime, deflagre a ação penal cabível); e a
responsabilidade civil (ajuizamento de ação cabível para postular
a reparação de danos acaso sofridos pela Administração)”
1
REFERÊNCIA: art. 24, inc. IV, da Lei nº 8.666, de 1993; Acórdão
TCU 1.876/2007-Plenário.
2
Decreto federal nº 6.663/08, regulamenta a aferição sumária,
pelo Ministro de Estado da Integração Nacional, da caracterização
do estado de calamidade pública ou da situação de emergência,
aliada à impossibilidade de o problema ser resolvido pelo ente da
Federação.
3
TCU, Acórdão nº 3.153/2006-2ª Câmara - 017.060/2006-3 - "1.
Para a realização da contratação emergencial, prevista no art.
24, inciso IV, da Lei nº 8.666/1993, deve ficar demonstrada a
concreta potencialidade do dano, devendo a contratação direta ser
via adequada e efetiva para eliminar o risco, não derivando de
eventual desídia do administrador (Decisão nº
347/1994-TCU-Plenário)."
4
TCU, Acórdão nº 4.234/2009-2ª Câmara - "1.5.1. à
Superintendência Regional do Trabalho e Emprego - SRTE/SE que:
1.5.1.1. adote, com antecedência suficiente, as providências para
elaboração de procedimentos licitatórios com vistas a concluí-los
antes do término dos contratos de prestação de serviços
porventura vigentes, evitando-se, com isso, utilização indevida de
dispensa de licitação com fundamento no art. 24, inciso IV, da Lei
de Licitações;"
5
TRF 1º Região – “1. A contratação de empresa para
fornecimento de materiais para a nova sede do CREA-AC, sem a devida
licitação e sem as devidas formalidades legais, amolda-se à
conduta típica descrita na Lei nº 8.666/93 (art. 89), e, portanto,
passível de punição. 2. O interesse em realizar a inauguração
da nova sede ainda no curso da gestão do acusado não constitui
emergência capaz de viabilizar a dispensa de licitação.3.
Improvimento do recurso de apelação. (Apelação criminal nº
1999.30.00.000545-4/AC; Rel.:Des. Fed. Olindo Menezes . –
Public.: 12/05/2006 DJ p. 09).
6
TCU, Acórdão 1705/2003 – Plenário "9.5.10 - adote
procedimentos administrativos com vistas à abertura e tramitação
de processos licitatórios em tempo hábil, de modo a evitar
dispensas indevidas de licitação, embasadas no inciso IV do artigo
24 da Lei n. 8.666/1993 (item V-J do relatório de auditoria);".
7
Idem, p. 530.
8
Idem pp. 677/678.
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